Tempo da Maturidade.
04/05/2012 12:50
TEMPO DA MATURIDADE
Vamos pensar um pouco sobre como se apresenta a maturidade, independente do momento em que ela se dê.
Percebe-se que a palavra maturidade vem carregada de um valor positivo. Dizer que alguém teve uma atitude madura corresponde a um elogio, portanto, um valor positivo.
A maturidade também está ligada à idéia de plenitude: com a “posse” da maturidade, o desenvolvimento estaria de alguma forma, pleno e encerrado.
Se tivéssemos que representar graficamente a trajetória humana, não desenharíamos uma reta, mas sim um círculo que se amplia. Tudo aquilo que já fez parte do percurso na fica para trás nem para fora do círculo, mas permanece ali, somando-se a novas vivências.
O modo de ser maduro é uma possibilidade concreta também para crianças e adolescentes. Este é um modo de ser do Dasein (ser humano) e pode acontecer em momentos não previstos pela nossa cultura.
Na terapia, há momentos em que o paciente é capaz de vivências muito maduras, de uma amplitude e intensidade que espantam até ele mesmo. Se, neste momento, ele disser “então agora estou maduro!”, vai descobrir, algum tempo depois, que a maturidade esvaiu-se, evaporou-se. Poderá pensar que regrediu, mas não se trata de regressão. É que a maturidade não se instala como posse, não acumulamos maturidade, pois faz parte do desenrolar da vida, nos enrolarmos de novo.
Na posse, existe uma profunda vontade de paralisar o tempo. Pretender possuir a maturidade equivale a acreditar que uma vez tendo ficado maduro, será possível se proteger das modificações que o tempo continua trazendo. Entretanto, é enganosa essa idéia de vencermos o próprio tempo.
Para o Dasein, a maturidade sempre será transitória, não só por sua condição de ser mortal, mas também por sua condição essencial de ser temporal. Os momentos de maturidade serão sempre momentos! O fato de termos chegado a um momento de maturidade não significa que isso se tornou um status. O ser maduro é um modo de ser cuja essência comporta o não precisar chamar a atenção.
Cabe aqui falarmos de receber, de doar. O ato de receber fundamenta o sentido da ação de dar. Aquele que recebe faz por aquele que doa. A disponibilidade para receber, ou seja, não precisar se sentir sempre o doador faz parte de uma condição de maturidade. Quem vive nessa disponibilidade poderá perceber o quanto as coisas são dadas, nos são concedidas.
Ser capaz de receber não significa passividade. Supõe, ao contrário, o movimento de acolher aquilo que nos é dado, e essa disponibilidade para acolher nem sempre é fácil.
Falamos de receber, de aceitar. Essa palavra nos lembra de outra muito próxima, que é a entrega. Aceitar implica responder a uma solicitação do mundo e essa resposta pode exigir uma entrega àquilo que solicita. Pensar que esta entrega, este “estar a serviço de”, ao invés de pensar como o senso comum “como posso me servir disso”, tem a ver com maturidade, contudo é extremamente estranho em nossa cultura este modo novo de pensar, uma cultura que valoriza tirar proveito de tudo e sempre com pressa.
O modo de ser maduro está presente quando conseguimos conviver com a percepção de nossa finitude e também com a percepção de todos os outros limites a que estamos sujeitos, entre os quais incluem a ausência de quem gostaríamos de ter próximo, a aceitação de que não podemos tudo...
A maturidade é o momento em que uma pessoa vivencia um modo de ser que procura ser mais “próprio”. A pessoa pode começar a ser mais “propriamente ela” e se afastar dos parâmetros “a gente”, “nós” e que, no fundo, ao perguntarmos de quem se trata, a resposta é “ninguém”.
Na maturidade, a relação com a totalidade muda. O todo é percebido como o vazio pleno de possibilidades e, aqui, possibilidade não tem o caráter de “ter de ser” alguma coisa, ela é, de fato, possibilidade: “eu posso ser” ou “posso não ser” o que eu quiser! É relativamente fácil sabermos o que queremos, devemos, precisamos e pretendemos fazer. O difícil e praticamente impossível é sabermos o que estamos fazendo.
Maturidade significa a necessidade de fazer algumas escolhas. Escolhemos, porém, sempre entre aquilo que nos é dado escolher. Momento a momento somos solicitados e nossas escolhas são feitas diante do que nos é dado conhecer das possibilidades que se apresentam e do que nos é dado, sendo quem somos. Nossa entrega às solicitações do mundo e o modo como conseguimos responder a elas fazem de nós a pessoa que somos.
Não é mais aceitável, na maturidade, uma ingenuidade que não deixa perceber a situação concreta que nos cerca, o que se torna oportuno e o que deixa de ser oportuno. Esse desencanto não significa um viver amargo, sem expectativas e planos, mas uma quebra daquela ingenuidade, daquele “estar encantado” que nos faz acreditar que as coisas têm de ser como queremos.
Maturidade não é sinônimo de idade adulta, é sim ser capaz de fazer escolhas sabendo que, ao escolher este algo, o outro não escolhido ficará para trás. É saber que ao abrir uma porta, outra irá se fechar, mas neste momento a maturidade nos fará perceber que escolhemos o que seria o melhor para nós, de acordo com as vivências que tivemos até aqui.
REFERÊNCIAS
POMPÉIA, J. A.; SAPIENZA, B. T. Na presença do sentido: uma aproximação fenomenológica a questões existenciais básicas. 2ª Ed. São Paulo, Educ, 2010.