Sobre Psicoterapia.

01/10/2012 20:33

 

Sobre Psicoterapia
 

Muitas pessoas, quando ouvem falar em psicoterapia (ou popularmente “terapia”), podem imaginar erroneamente uma situação em que alguém está prestes a ficar desequilibrado mentalmente, ou alguém que precisa ser controlado de alguma maneira, ou ainda que se trata de tornar alguém capaz de seguir um tipo de padrão. Mas essas mesmas pessoas se esquecem de que ninguém está na vida para ser controlado, dirigido, impedido de ser livre, ou posto num lugar onde não lhe pertence, uma vez que o Dasein é um constante vir-a-ser, está aberto para o mundo e para as possibilidades de sua existência.

Na verdade, vivemos nossas vidas durante muito tempo sem ter a noção daquilo que estamos sentindo, de quais coisas gostamos, do porque precisamos de algumas relações, ou porque não nos sentimos do jeito que achamos que deveríamos. 

Isso acontece por estarmos olhando para nós mesmos a partir de um referencial comparativo e meramente externo, no qual esperamos encontrar respostas sobre essas perguntas em outras pessoas – nos amigos, pais, família, colegas de trabalho, ou em nossa cultura - seja observando comportamentos de outros grupos, seja ouvindo falar como deveriam ser as coisas, entre outros. Essa percepção é baseada no senso comum, em que as pessoas “devem” se comportar de uma maneira correta ou “normal”. 

Na Psicologia existem várias linhas de pensamento e métodos de trabalho. De maneira geral, são baseadas em diferentes visões do ser humano. Essas visões, que podem ser parecidas ou distintas entre si, formam a base que o psicólogo utiliza para tratar os pacientes. Tais fundamentos, mais o treinamento que se tem para lidar com o discurso e as questões da vida dos pacientes, já servem como auxílio para que possa ocorrer um processo de autoconhecimento. 

O senso comum não se aplica dentro do contexto psicoterapêutico, ainda que ele esteja presente em questões pessoais do paciente. Porém, o psicólogo é treinado a não seguir esse senso comum, que diz aquilo que a estatística ou as médias populacionais dizem a respeito do que é normal ou do que não é normal. 

O psicólogo, por outro lado, tem como base outros fundamentos que dizem respeito àquilo que mais se aproxima da realidade psíquica dos pacientes, ou seja, do ponto de vista deste paciente a respeito da sua própria existência. De maneira resumida, o que faz com que nos comportemos desta ou daquela maneira é como vemos e compreendemos a nós mesmos e o mundo que nos cerca. O psicólogo tem uma função terapêutica de compreender como é a visão de mundo do seu paciente e a percepção que ele tem de si mesmo, sem julgamentos, sem dizer se ele está certo ou errado e, principalmente, sem dizer a ele o que deve fazer, pois o psicólogo não detém tal poder sobre a vida de ninguém. O que acontece num setting terapêutico são apontamentos, reflexões: o psicólogo tira o paciente de sua zona de conforto para que ele pense, reflita e chegue a suas próprias conclusões acerca do que deve fazer no que se refere à sua problemática.

Por exemplo, se uma paciente tem dificuldade de relacionamento com os pais, em que eles vivem criticando suas escolhas e atitudes e este paciente vive se queixando da cobrança deles, entre outras reclamações, o senso comum diria o que? Que uma das pessoas está errada, que ou os pais devem mudar, ou a pessoa deve mudar, pois alguém ou alguma coisa está errada. Então, o psicólogo irá mostrar ao paciente como ambos nesta família estão agindo, sugerir pontos de partida para mudar esta constelação familiar conflituosa, possibilitando ao paciente que pense sobre estas questões e chegue à conclusão do que deve ser feito.

O psicólogo não julga, não critica e isso já se faz muito importante no processo terapêutico, pois o paciente não se sente cobrado e pode perceber se ele mesmo não está se julgando e criticando, mais até do que os outros possam estar fazendo.

Um dos objetivos mais importantes, senão o mais importante da psicoterapia é fazer cada pessoa se sentir (e saber que é) responsável por sua própria existência.

A tentativa de controlar a vida dos outros não é saudável para nenhuma das partes. Talvez durante a fase onde a criança precise de modelos a seguir, precisa que lhe digam o que é certo e errado, o que fazer em certas situações, isso possa ser um tipo de controle, mas é vital. Depois, o que acontece é que cada pessoa passa a ser controlada por seus próprios pensamentos, crenças, condicionamentos e nem sempre se percebe responsável por sua própria maneira de viver a vida. 

O modelo que se tem no senso comum é o de controle: controle de si mesmo, controle da vida, controle dos outros, em alguns casos. Os pais querem controlar os filhos, fazer com que eles sejam mais educados e inteligentes, que estudem mais e prestem atenção na escola. Alguém que nunca fez terapia antes quando criança e chega num consultório de psicologia em idade adulta, cheio de dúvidas e questionamentos, pode sentir em algum momento que será controlado pelo terapeuta, ou sem perceber pode tentar controlá-lo. Ou então quem chega com um problema específico, quer uma resposta e solução rápidas, quer saber como controlar o próprio comportamento, seus sentimentos, suas ações. 

Essa visão de controle que existe em nossa cultura e na vida cotidiana não se aplica dentro dos consultórios, mesmo em casos nos quais seja exigido um acompanhamento diferenciado, em casos de álcool e drogas, ou em compulsões e estados emocionais patológicos graves. O que existe é um acompanhamento que leva em conta cada movimento, comportamento, pensamento, para que assim o paciente possa perceber clara e facilmente tudo o que acontece com ele, possibilitando que tenha mais oportunidade de escolher mudar. 

Finalizando, no consultório de um psicólogo, que não julga e não controla o comportamento do paciente, busca-se a autenticidade deste, que ele possa ser verdadeiro consigo e com todos que fazem parte de sua existência.

 

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Priscila Didone - Psicóloga e Analista do Comportamento
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